A INTERPRETAÇÃO ECONÔMICA NO DIREITO TRIBUTÁRIO

Entre os dias 23 e 25 de junho, realizou-se, em Natal, sob a coordenação dos Professores Bento Herculano Duarte e André Elali e com a participação de alguns dos mais renomados tributaristas brasileiros, entre eles Alcides Jorge Costa, Ricardo Lobo Torres e Paulo de Barros Carvalho, evento destinado a examinar aspectos da realidade jurídico-tributária atual.

Coube-me tratar do tema relacionado à interpretação econômica no direito tributário.

Pessoalmente, entendo que tal técnica de interpretação, que objetiva superar a legalidade e a liturgia das formas para atingir supostos objetivos imputados ao contribuinte – e que quase sempre leva a autoridade fiscal a desconsiderar os negócios jurídicos celebrados pelo particular, para escolher aquele que implique tributação mais elevada – não é compatível com os princípios da estrita legalidade, da tipicidade fechada e da reserva absoluta da lei formal.

A própria norma antielisão, introduzida pela lei complementar n. 104/01 e ainda não regulamentada por lei ordinária – condição de sua aplicabilidade – maltrata a Constituição Federal e os princípios acima enunciados, pois os “flexibiliza”, a ponto de fazer prevalecer o palpite fiscal sobre as rigorosas formas estabelecidas pelo ordenamento positivo e que podem legitimamente ser adotadas pelo contribuinte, mesmo que seja, exclusivamente, para, entre duas alternativas, optar por aquela que lhe acarrete menor incidência tributária.

Vive, o Brasil, hoje, a insegurança jurídica máxima, com alguns magistrados deferindo mandados inespecíficos de buscas em escritórios de advocacia, quando não, determinando a prisão de contribuintes e advogados, sem haver sequer autos de infração lavrados, e sem dar acesso aos interessados às “secretas” peças de acusação.

O direito de defesa, assegurado pelo artigo 5º, inciso LV da C.F., é implodido, principalmente porque – permitindo a lei penal tributária que um contribuinte, uma vez autuado, pague o tributo ao invés de contestar a exigência, extinguindo a punibilidade de eventual crime – a prisão, independente de autuação, atinge a liberdade, direito fundamental do contribuinte. Tal procedimento, pode ensejar, contra a União, pesadas indenizações por danos patrimoniais e morais, que por sua vez, poderá exigir ressarcimento dos próprios agentes públicos que tiverem causado aos prejuízos (art. 37, §6º da C.F.), mediante o ajuizamento de ações de regresso imprescritíveis (art. 37, §5º da C.F.).

O certo, todavia, é que, nada obstante a falta de eficácia da Lei Complementar 104/01, por sua não regulamentação até esta data – aliás, trata-se de ato legislativo cujo projeto é de autoria de desconhecidos juristas palacianos, ao contrário do CTN redigido pelos mais ilustres doutrinadores da época -, ela tem ensejado diversas autuações fiscais, com arsenal de intimidação para que o contribuinte não exerça seu direito de impugnação, o que resgata a memória das autoridades fiscais do tempo do regime militar de exceção, que, de rigor, eram mais respeitadoras do direito de defesa do contribuinte.

Tenho para mim que o artigo 150, inciso I da Constituição Federal não é apenas repetitivo do art. 5º, inc. II, mas explicitador de que ao Fisco cabe a espada da imposição, nos estritos limites do que a Constituição lhe permite, e, ao contribuinte, defender-se com o escudo da lei suprema para que não seja obrigado a submeter-se a exigências indevidas.

Pretende, todavia, o Fisco suprir as omissões legislativas por interpretações econômicas, superativas da lei formal. Porém, em direito tributário, não cabe a interpretação econômica. Sendo o tributo uma norma de rejeição social (Teoria da Imposição Tributária, Ed. LTR, 2ª. ed., 1998), deve o Fisco respeitar, rigorosamente, o disposto na legislação para exigir os tributos constitucionalmente devidos, não podendo jamais desconsiderar, superar, eliminar as formas legais e legitimamente adotadas pelo contribuinte, para fazer prevalecer outra, à sua escolha, que implique maior arrecadação.

Creio – e foi esta a minha posição, na conferência proferida no referido encontro nacional – que cabe ao Poder Judiciário, uma vez provocado, afastar as arbitrariedades que vêm sendo cometidas, e a pretendida técnica exegética que carece de amparo legal e constitucional, a bem da segurança jurídica, da justiça tributária e do desenvolvimento nacional.

Ives Gandra Martins é professor Emérito da Universidade Mackenzie e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército. Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Advogado da Advocacia Gandra Martins.

* Esse artigo não reflete necessariamente a posição do escritório Soares de Mello e Valim Advogados Associados

A Lei Geral de Proteção de Dados…

A Lei Geral de Proteção de Dados, popularmente.. + continuar

Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Energia…

A Constituição Federal, em seu artigo 155, inciso.. + continuar

Médicos: o novo alvo da Prefeitura de…

Em função dos serviços que prestam, muitos dos.. + continuar